17 de janeiro de 2012

Do Grão à Árvore


"E imediatamente o pai do menino exclamou com lágrimas: Eu creio! Ajuda-me na minha falta de Fé!"

Marcos 9:24

Ele se sentia extremamente cansado.

Não cansado como alguém que correu demais, mas cansado no sentido literal da palavra.

Cansado do Cansaço constante.

Cansado da inexistência de Paz.

Cansado de ter um filho vivo, mas que parecia viver a Morte.

O Esgotamento dominava cada célula de seu corpo e cada cômodo de sua mente.

anos ele não experimentava o sabor de um dia tranquilo.

Não que nunca tivesse tentado.

Ele tentou muitas vezes, o que só acabou deixando-o ainda mais cansado.

Tentou brincar com o filho no jardim.

Tentou levar o filho para pescar.

Tentou acampar com o filho no quintal.

Em todas as ocasiões, no entanto, Aquilo os interrompeu.

Aquilo que escravizava seu filho e, como um acréscimo, partia o seu coração.

Quando ele dizia "Aquilo", referia-se ao Demônio que assolava seu filho desde o dia de seu nascimento.

Um Demônio (não se assuste com uso dessa palavra, você precisa saber que eles existem) implacável.

Graças a ele, a criança não falava, era muda. Esse, porém, era o menor dos males.

O Demônio causava-lhe convulsões terríveis, fazendo com que o menino se debatesse no chão e espumasse pela boca.

Por incrível que possa parecer, porém, este ainda não era o pior dos males.

A pior parte de tudo aquilo eram as tentativas de Suicídio.

Diariamente, o Demônio tentava afogar ou incendiar o menino com a intenção de matá-lo.

Creio que você pode agora entender o porquê do Cansaço daquele pai.

Cada segundo vinha acompanhado de uma Incerteza:

"O que esse Demônio fará com meu filho hoje?"

O pai precisava dormir com os olhos semi-abertos e tomar banho com a porta destrancada.

A Tragédia era uma vizinha incômoda que poderia bater à porta em qualquer momento...



***

Olhe para o coração deste pai.

Você encontrará um pouco de quase tudo.

Amargura, Tristeza, Revolta, Rancor...

Tudo menos .

E quem poderia culpá-lo?

Como ter numa vida banhada em Decepções?

Ele já tentara ter, mas de nada adiantara!

Teve Fé nos médicos, mas eles lhe tomaram todo o dinheiro.

Teve Fé nos curandeiros, mas eles lhe tomaram toda a paciência.

Teve Fé em si mesmo, mas sua força se esgotara.

Sua naquele momento era tão minúscula quanto um grão de mostarda.

(Op's, acho que acabo de dar uma pista do final desta história)

Um dia (apenas mais um em meio a tantos), um vizinho apareceu com mais uma sugestão:

- Ouvi falar de um tal Jesus, - Disse-lhe. - que cura todos os tipos de enfermidade. Por que não leva seu filho até Ele?

O pai bufou e coçou a barba.

Sentia-se cansado demais para encarar mais uma decepção.

- E quanto esse tal de Jesus cobra? - Perguntou, indiferente.

- Não cobra nada! Ele se diz Filho de Deus!

O pai sufucou uma risada amarga e pensou por um instante.

E, ainda que ele não soubesse, naquele momento o Espírito Santo lhe convenceu a ir.

- Eu vou. - Disse, ainda indiferente. - Se for perda de tempo, será só mais uma...

E é aqui, quando ele pega o filho pelo braço e começa a caminhar, que nosso Post começa a esquentar.

Estique as pernas e calce sapatos confortáveis.

Convido você a acompanhar a caminhada desse pai até chegar ao Pai.

Será emocionante, eu garanto.

Lembra-se daquele grão de mostarda do qual eu falei?

Prepare-se para ver o que Deus fará para transformá-lo numa grande árvore...



***

CENA 1

Cansado e mal-humorado, o pai chega até o local onde lhe disseram que Jesus está.

Um grande número de pessoas agitadas cercam um pequeno grupo de homens.

Após algumas cotoveladas e empurrões, o pai consegue se aproximar.

- Aquele ali é Jesus? - Pergunta a um homem ao seu lado.

- Não. - Responde o estranho. - Aquele é Pedro, discípulo d'Ele.

- E onde Jesus está?

O homem dá de ombros, como quem não sabe.

O pai fecha os punhos e morde os lábios.

"Mas que cara irresponsável!", pensa, "Andei até aqui, meu filho pode cair no chão a qualquer momento e ele nem aqui está!"

Obviamente, aquele Jesus, assim como os médicos, não se importava com seu filho.

Ele pensa em ir embora, mas, já que está ali, não custa nada esperar um pouco.

Relutantemente, o pai se coloca na fila para chegar aos discípulos.

Sem saber que seu grão de mostarda estava sendo regado durante aquele primeiro obstáculo...



***

CENA 2

Durante alguns minutos, o pai sente uma estranha pontada de... Como é mesmo o nome daquilo...?

Esperança. (Nossa, ele nem sabia que ela ainda existia!)

Os tais discípulos pareciam realmente ter algum tipo de poder.

Ele vira (com os próprios olhos!) cegos saírem enxergando e paralíticos, andando.

Por isso, como uma semente em pleno sertão nordestino, a Esperança brota em seu peito.

Ele olha para o filho e acaricia seu rosto, tão jovem, mas tão sofrido.

A fila anda e, finalmente, chega a sua vez.

- Este é o meu filho. - Diz, sem querer parecer muito ansioso. - Existe um Demônio que muito o atormenta e disseram-me para trazê-lo até Jesus. Ele não está aqui, mas...

Pedro, o tal Discípulo, sorri.

- Jesus não precisa estar aqui pessoalmente para agir. - Explica carinhosamente. - Em nome d'Ele, seu filho será liberto.

O coração do pai acelera ao ver Pedro pôr a mão sobre a cabeça de seu filho.

"Será?", ele ousa pensar, "Será que nosso tormento acabará?"

Pedro, confiantemente, declara:

- Demônio que atormenta este menino, eu te ordeno em nome de Jesus que você saia agora mesmo para nunca mais voltar!

O pai se prepara para sorrir, mas é interrompido pelo desespero.

O filho começara a se debater novamente. Mais uma convulsão.

O toque de Pedro (e o nome do tal Jesus) de nada adiantara.

Ao ver o filho ser apontado pela multidão, o pai lança a Pedro um olhar de desprezo e fúria.

- Eu não sei o que aconteceu... - Responde o apóstolo, visivelmente confuso. - O Nome nunca falhou. Eu realmente não entendo...

- Pois eu entendo. - Interrompe-o o pai, pegando o filho nos braços. - Entendo muito bem.

Sentindo-se um tolo por ter sido ludibriado novamente, o pai se prepara para ir embora.

- O que está acontecendo aqui? - Uma voz impetuosa soa acima do ruído da multidão.

O pai se vira para encarar o dono da voz.

Ninguém precisa lhe dizer quem Ele é. Sua imagem fala por si mesma.

Jesus, o tal Senhor, acabara de chegar.



***

CENA 3

Ele queria gritar. Queria insultar. Queria acusar.

Por algum motivo, no entanto, sentia-se acuado. Ou, mais do que isso, sentia-se desarmado.

Como se aquele homem, apesar de tudo (sua ausência, seu Nome inútil), não merecesse ser maltratado.

Por um momento, todos se calaram.

Jesus continuava à espera de sua resposta.

- Mestre, - Disse o pai, contendo a raiva. - Trouxe meu filho para que o Senhor o libertasse de um Demônio que muito o atormenta, mas seus discípulos não conseguiram expulsá-lo...

"Enquanto você estava fora, seu bando de incompetentes fraquejou!", era o queria ter dito.

- Onde está o menino? - Pergunta Jesus, num tom irritante calmo.

O pai lhe mostra o filho, àquela altura já recuperado da crise anterior.

Quando seus olhos se cruzam com os de Jesus, porém, o garoto cai novamente no chão.

O pai sufoca um grito.

De tudo que já presenciara, aquela era a convulsão mais violenta que seu filho já tivera.

A multidão grita e o pai se desespera. Para sua surpresa (e ira!), Jesus permanece calmo.

- Há quanto tempo isso acontece com ele? - Pergunta o Mestre, enquanto o menino se debate no chão.

O pai sente um ímpeto de esganar aquele homem.

Qual é o sentido daquela pergunta num momento como aquele?

Por que ele não o cura ou pelo menos tira o seu filho do chão?

Que tipo de insensível consegue conversar enquanto uma criança sofre daquela forma?

Jesus permanece, pacientemente, em silêncio, como se estivessem confortavelmente sentados à mesa, tomando chá.

O pai abre a boca, pronto para responder com o pior desaforo possível.

Até que elas chegam.

Ele não entende por que, mas elas vem à tona.

Lágrimas.

Lágrimas copiosas e doloridas.

Lágrimas do mais puro Cansaço...



***

CENA 4

- Isso acontece desde sempre! - Responde o pai, rendido. - Esse Demônio faz de tudo para matá-lo e... eu simplesmente não aguento mais!

Pela primeira vez, ele confessa sua fraqueza.

Lembranças dolorosas lhe vem à mente, como leões implacáveis.

Dor. Dor de corpo, alma e espírito.

Humilhação acumulada há anos.

(Muito!) Cansaço.

E mais lágrimas.

Em meio à tudo isso, Jesus permanece em silêncio.

O menino continua a se debater.

O pai continua a chorar.

E, naquele exato instante, o grão de mostarda rompe a terra seca.

O pai abandona o rancor, a ira e a revolta.

Resta-lhe apenas o desespero...

e o minúsculo grão.

Juntando-os, o pai reúne força suficiente para clamar:

- Mas se o Senhor pode fazer alguma coisa para nos ajudar, tenha compaixão de nós!

As palavras "mas" e "se" não soam muito confiantes, mas as palavras "Senhor" e "Compaixão" fazem os olhos de Jesus brilharem.

- Eu posso. - Responde o Mestre. - Tudo é possível ao que crê.

Naquele momento, o pai finalmente compreende.

"ao que crê"...

Não "ao que se revolta", "ao que se garante" ou "ao que desiste"...

Ao que crê.

Diante de um homem desconhecido e de seu filho à beira da morte, ele se vê pronunciando a mais improvável de todas as frases:

- Eu creio! - Diz, segurando o grão de mostarda. - Ajude-me na minha falta de Fé!

Sua lhe parecia pequena demais diante de seu desespero.

Ele temia que ela não fosse suficiente.

Mas, como sabemos, qualquer Fé é suficiente para mover o coração de Deus.

A é a senha que abre o cofre dos Milagres.

Jesus não grita (Ele não precisa). Tampouco fala alto. Basta um sussurro para que o Inferno ouça:

- Demônio mudo e surdo, saia deste jovem e não volte nunca mais!

O menino para. Literalmente para.

...

Silêncio. Nada acontece.

- Está morto! - Diz alguém (sem nenhum grão) entre a multidão.

O pai olha para o corpo inerte do filho e para o rosto sereno de Jesus.

E, naquele momento, decide em quem acreditar...



***

CENA 5

Jesus levanta o menino pelos braços.

O menino acorda e olha para o pai.

Um olhar puro. Um olhar próprio. Um olhar liberto.

O pai o abraça.

- Meu filho! Meu filho querido!

O menino retribui o abraço.

- Acabou, papai. - Diz o ex-mudo. - Ele foi embora. Para sempre. Confiamos na pessoa certa agora.

O pai olha para Jesus, que apenas ergue as sobrancelhas.

O Mestre não precisa falar para que o pai saiba o que Ele quer dizer.

"Tudo é possível ao que crê."

- Obrigado, Senhor.

Jesus assente com a cabeça

E os três vão embora de mãos dadas.

O menino, seu pai, e o Grão.

Quero dizer, e a Árvore...

Um comentário:

  1. Arthur,
    Li na bíblia hoje uma passagem que fala sobre o grão de mostarda ser a menor das sementes mas gerar uma árvore enorme. Fiquei curiosa para saber como era a árvore de mostarda e fiz uma busca de imagem no google. Cheguei ao seu post porque achei linda a foto da menininha olhando para os origamis na parede. Li o post inteiro e fui muito abençoada. Era exatamente o que eu estava precisando ouvir de Deus nesse momento.
    Agradeço a Deus pela sua vida e vou seguir o seu blog a partir de agora.
    A paz.

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